Jurisprudência de licitações e contratos


PLENÁRIO

1. A revogação de certame licitatório não configura impedimento para a aplicação da sanção de declaração de inidoneidade para licitar e contratar com a Administração Pública Federal, prevista no art. 46 da Lei nº 8.443/1992
Denúncia apontou a ocorrência de possíveis irregularidades que teriam sido cometidas pelas empresas Microsens Ltda. e Vale Tecnologia Ltda., no curso do Pregão Eletrônico 3/2009 promovido pelo Tribunal de Contas da União, que tinha por objeto a formação de registro de preços, para aquisição de impressoras e respectivos suprimentos. A despeito de o TCU haver revogado o certame e promovido o cancelamento da Ata de Registro de Preços dele resultante, considerou o relator necessário dar seguimento ao feito, com o intuito de apurar o aparente conluio entre as citadas empresas. Levou em conta a proximidade geográfica das sedes das empresas, a existência de relação de parentesco entre os sócios das empresas, o desinteresse da empresa Vale em cobrir o lance da Microsens no certame em análise, a coincidência de números telefônicos das empresas, a associação de sócio da Vale com a Microsens, e outros indícios. Após examinar as razões de justificativas das empresas, a unidade técnica considerou demonstrado o conluio entre elas.  Acrescentou que “a apenação é plenamente cabível, ainda que o certame alvo da denúncia tenha sido revogado pela administração, sem ocorrência de dano ao erário”. Lembrou de precedente por meio do qual o Tribunal declarou a inidoneidade de empresa, a despeito de não se ter configurado dano ao erário (Acórdão 856/2012 – Plenário). O Relator considerou que os elementos contidos nos autos atestam a ocorrência da aventada fraude. O Tribunal, então, ao acolher sua proposta, decidiu, com suporte no comando contido no art. 46 da Lei 8.443/1992: “9.2. declarar a inidoneidade da empresa Microsens Ltda. para licitar e contratar com a administração pública federal pelo prazo de 3 (três) anos; 9.3. deixar de aplicar a pena de inidoneidade à empresa Vale Tecnologia Ltda., ante a informação de que esta encerrou suas atividades em dezembro de 2009”. Precedentes mencionados: Acórdão 856/2012 - Plenário. Acórdão n.º 2425/2012-Plenário, TC-013.658/2009-4, rel. Min. Aroldo Cedraz, 5.9.2012.

2. A exigência contida em edital de licitação de que periféricos (teclado, mouse e monitor) tenham o mesmo fabricante que os de desktops e estações de trabalho a serem adquiridos afronta o disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93
Representação formulada por empresa acusou possíveis irregularidades na condução do Pregão Eletrônico nº 90/2011, promovido pela Fundação Universidade Federal do ABC (UFABC), com a finalidade de formação de registro de preços para “aquisição de equipamentos de informática para uso didático e administrativo”. Em face dos indícios de irregularidade identificados, o relator concedeu medida cautelar, a fim de obstar a celebração de contratos ainda não firmados com base na ata de registro de preços resultante dessa licitação. Determinou, em seguida, a realização de oitivas da UFABC e das empresas declaradas vencedoras do certame. Destaque-se, entre os supostos vícios,“a exigência de equipamento com periféricos do mesmo fabricante, sem possibilidade de aceitação de monitor, teclado e mouse de diferentes marcas, o que teria afrontado o disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93. A unidade técnica especializada do Tribunal, após considerar as respostas às oitivas, que alegaram necessidade de garantir a “compatibilidade dos periféricos com a CPU”, lembrou que: “Os periféricos em questão (teclado, mouse e monitor) possuem interfaces amplamente padronizadas, independentemente do fabricante. Além disso, em caso de eventuais falhas, os fabricantes de equipamentos e sistemas operacionais disponibilizam constantemente atualizações gratuitas que corrigem possíveis falhas”. Por esse motivo, concluiu que a citadas exigências contribuíram para restringir o caráter competitivo do certame. O relator endossou tal raciocínio. O Tribunal, então, ao acolher proposta do relator, em face dessa e de outras irregularidades identificadas no certame, decidiu: a) determinar à UFABC que se abstenha de celebrar novos contratos para a aquisição de estações de trabalho e desktops (itens 1, 2 e 3 da citada ata) e que não permita adesões a esses itens da ata; b) dar ciência à UFABC de que “a exigência de equipamento com periféricos do mesmo fabricante, sem possibilidade de aceitação de monitor, teclado e mouse de diferentes marcas, afronta o disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93”. Acórdão n.º 2403/2012-Plenário, TC-032.116/2011-0, rel. Min. José Jorge, 5.9.2012.

3. A exigência constante de edital de licitação no sentido de que desktops e estações de trabalho apresentem formato de gabinete do tipo BTX, em detrimento de tecnologia mais difundida para solução de aquecimento desses equipamentos, como a ATX, afronta o disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93
Ainda no âmbito da Representação que tem por objeto o Pregão Eletrônico nº 90/2011, promovido pela UFABC, destaque-se o seguinte indício de irregularidade: exigência do padrão BTX (Balanced Technology Extended) para as estações de trabalho e computadores a serem adquiridas, em detrimento de outros padrões como o ATX (Advanced Technology Extended), o que teria restringido o caráter competitivo do certame. Esclareceu a unidade técnica especializada que o formato de gabinete BTX é uma das alternativas, dentre diversas outras desenvolvidas pelos fabricantes, para enfrentar o aquecimento dos componentes dos computadores. Ao refutar as justificativas em resposta às oitivas realizadas, anotou que a opção pela escolha da tecnologia [padrão BTX], “em detrimento de outra mais disseminada [padrão ATX], sem a devida caracterização de sua necessidade, tende apenas a prejudicar a competitividade do certame”, com direcionamento para apenas um grupo de fabricantes. Tal exigência implicou, pois afronta ao disposto no disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93. O relator endossou as ponderações da unidade técnica. O Tribunal, então, ao ratificar a proposta do relator, decidiu: a) determinar à UFABC que se abstenha de celebrar novos contratos para a aquisição de estações de trabalho e desktops e que não permita adesões a esses itens da ata; II) dar ciência à UFABC de que: “a opção pelo padrão BTX, em detrimento de outra tecnologia mais disseminada, sem a devida caracterização de sua necessidade, não está em consonância com o teor do art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93”. Acórdão n.º 2403/2012-Plenário, TC-032.116/2011-0, rel. Min. José Jorge, 5.9.2012.

4. É lícita a utilização de prova emprestada no processo do Tribunal, como no caso em que se apura fraude a licitação, desde que haja autorização judicial para esse aproveitamento e seja observado, no processo administrativo, o contraditório e a ampla defesa acerca de tal prova
Levantamento de Auditoria originário de Representação formulada pelo Procurador-Geral do Ministério Público junto ao TCU, cuidou de verificar a ocorrência de suposta fraude à licitação que teve por objeto a contratação das obras de construção das barragens do Rio Preto no Distrito Federal, o que teria favorecido a empresa Gautama Ltda. Vários indícios robustos de conluio foram trazidos aos autos, como:  a)  inclusão de um item de serviços não contemplado pela planilha orçamentária base da licitação, por todas as licitantes, com exatamente as mesmas descrições, inclusive para os subitens, e exatamente os mesmos quantitativos e preços unitários e total; b)  coincidências exatas em erros de grafia nas propostas orçamentárias apresentadas pelas empresas Gautama e Artec. Além desses, destaquem-se, também, os seguintes indícios: c) possível “esquema de subcontratação” em outra licitação em que a Gautama se sagrou vencedora, no Estado do Piauí, sob a condução da Cepisa, cujo objeto consistia na execução das obras do programa Luz Para Todos, conforme informação extraída de degravação de escutas telefônicas obtidas pela Polícia Federal, no âmbito da “Operação Navalha; e d) aparente confecção do edital de licitação por dirigentes da Gautama Ltda., com posterior envio ao órgão licitante, para publicação, conforme informações também obtidas a partir da degravação das escutas telefônicas mencionadas no item anterior. As empresas Gautama, Artec e Fahma, além de insurgirem-se contra as premissas de caráter material que justificaram a presunção de terem praticado fraude à referida licitação, impugnaram as provas trazidas aos autos, oriundas dessas degravações.  O Ministério Público/TCU, ao ser chamado a se pronunciar sobre a validade de tais provas, lembrou que: “No caso presente, a prova emprestada é constituída de informações policiais elaboradas com base em gravações de conversas havidas por meio de ligações telefônicas, em documentos de registros de passageiros mantidos por empresas de transporte aéreo e em gravações de imagens realizadas em circuitos fechados de televisão localizados em aeroportos, hotéis e agências bancárias. Essas informações foram produzidas pela Polícia Federal em sede do referido Inquérito nº 544-BA (Operação Navalha) e, provenientes da Ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça – STJ –, chegaram a este Ministério Público, que delas deu conhecimento ao TCU mediante representação. Ao tratar da possibilidade de aproveitamento de provas no processo do Tribunal, discorreu sobre “qual tem sido o entendimento jurisprudencial prevalente sobre o aproveitamento, em processo administrativo, das informações produzidas na investigação penal ou na instrução processual penal”. Transcreveu, com esse intuito, extratos de julgados do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria e deles extraiu a seguinte orientação: “... é válido o aproveitamento, em processo administrativo, de informações produzidas na investigação penal ou na instrução processual penal, desde que haja autorização judicial para esse aproveitamento e desde que seja observado, no processo administrativo, o contraditório e a ampla defesa acerca da prova emprestada. O relator, por sua vez, em face do cumprimento dessas condições, acompanhou o entendimento do MP/TCU e da unidade técnica no sentido de que tais provas são lícitas e de que, juntamente com as outras contidas nos autos, demonstram ter havido fraude à referida licitação. O Tribunal, então, ao endossar, proposta do relator, decidiu, com base no art. 46 da Lei nº 8.443/1992 declarar a inidoneidade das empresas envolvidas na fraude para participarem de licitação no âmbito da Administração Pública Federal.  Acórdão n.º 2426/2012-Plenário, TC-015.601/2009-0, rel. Min. André Luís de Carvalho, 5.9.2012.

Nenhum comentário: