Jurisprudência de licitações e contratos


A perda da regularidade fiscal no curso de contratos de execução continuada ou parcelada justifica a imposição de sanções à contratada, mas não autoriza a retenção de pagamentos por serviços prestados
Consulta formulada pelo Ministério da Saúde suscitou possível divergência entre o Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) 401/2000 e a Decisão nº 705/1994 – Plenário do TCU, relativamente à legalidade de pagamento a fornecedores em débito com o sistema da seguridade social que constem do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf).  A consulente registra a expedição, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão de orientação baseada no Parecer 401/2000 da PGFN, no sentido de que “os bens e serviços efetivamente entregues ou realizados devem ser pagos, ainda que constem irregularidades no Sicaf”. Tal orientação, em seu entendimento, colidiria com a referida decisão, por meio do qual o Tribunal firmou o entendimento de que os órgãos e as entidades da Administração Pública Federal devem exigir, nos contratos de execução continuada ou parcelada, a comprovação, por parte da contratada, da regularidade fiscal, incluindo a da seguridade social. O relator, ao endossar o raciocínio e conclusões do diretor de unidade técnica, ressaltou a necessidade de os órgãos e entidade da Administração Pública Federal incluírem, “nos editais e contratos de execução continuada ou parcelada, cláusula que estabeleça a obrigação do contratado de manter, durante a execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação”, além das sanções resultantes de seu descumprimento. Acrescentou que a falta de comprovação da regularidade fiscal e o descumprimento de cláusulas contratuais “podem motivar a rescisão contratual, a execução da garantia para ressarcimento dos valores e indenizações devidos à Administração e a aplicação das penalidades previstas no art. 87 da Lei nº 8.666/93, mas não a retenção do pagamento”. Caso contrário estaria a Administração incorrendo em enriquecimento sem causa. Observou, também, que a retenção de pagamento ofende o princípio da legalidade por não constar do rol do art. 87 da Lei nº 8.666/93. O Tribunal, então, decidiu responder à consulente que os órgãos e entidades da Administração Pública Federal devem: a) “... exigir, nos contratos de execução continuada ou parcelada, a comprovação, por parte da contratada, da regularidade fiscal, incluindo a seguridade social, sob pena de violação do disposto no § 3º do art. 195 da Constituição Federal”; b) “... incluir, nos editais e contratos de execução continuada ou parcelada, cláusula que estabeleça a obrigação do contratado de manter, durante a integral execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, prevendo, como sanções para o inadimplemento a essa cláusula, a rescisão do contrato e a execução da garantia para ressarcimento dos valores e indenizações devidos à Administração, além das penalidades já previstas em lei (arts. 55, inciso XIII, 78, inciso I, 80, inciso III, e 87, da Lei nº 8.666/93)”. Acórdão n.º 964/2012-Plenário, TC 017.371/2011-2, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 25.4.2012.

A anulação de certame licitatório pela Administração, em razão de vícios graves identificados em fiscalização do Tribunal, não isenta os responsáveis de apenação, mesmo quando tal anulação seja implementada antes de deliberação definitiva do Tribunal
Auditoria realizada nas obras de construção da Barragem de Oiticica, no município de Jucurutu/RN (Fiscobras 2011), apontou indícios de irregularidades na condução da Concorrência 20/2010-Semarh e, por consequência, no Contrato 39/2010, firmado entre a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Estado do Rio Grande do Norte (Semarh/RN) e o Consórcio EIT/Encalso. Em face de tais indícios, o Tribunal decidira suspender cautelarmente a execução do citado contrato. Promovidas oitivas e audiências dos responsáveis, considerou o relator, ao respaldar análise da unidade técnica, que restou demonstrado: a) sobrepreço em diversos itens de serviços; b) restrição à competitividade na Concorrência 20/2010, em decorrência de critérios inadequados de habilitação e julgamento (exigência excessiva de execução de quantitativos mínimos e de quantitativos mínimos de serviços irrelevantes; exigência de número máximo de atestados para comprovar a execução de quantitativos mínimos; exigência de comprovação de vínculo empregatício de profissionais por meio de Carteira de Trabalho e Previdência Social); c) ausência das composições analíticas dos serviços da obra, com violação ao art. 7º, § 2º, inciso II da Lei 8.666/1993 e à jurisprudência do TCU, revelada pela Súmula 258 do Tribunal. O relator, então, a despeito de haver a Semarh/RN, posteriormente à identificação dos vícios acima relacionados, anulado a Concorrência 20/2010, anotou que esse fato “não tem o condão de eliminar do mundo jurídico as irregularidades perpetradas pelos gestores, por ocasião da condução daquele certame, persistindo os fundamentos de aplicação de multa aos responsáveis para as irregularidades cujas razões de justificativa foram rejeitadas”. O Tribunal, então, ao acolher proposta do relator, decidiu apenar os seguintes gestores da Semarh/RN: a) subcoordenador de obras, por ter elaborado e aprovado o orçamento que serviu de base à Concorrência 20/2010; b) subcoordenador de estudos e projetos, por ter elaborado o termo de referência contendo cláusulas restritivas e por ter elaborado e aprovado o orçamento-base da licitação sem as composições analíticas de todos os seus custos unitários; c) coordenador de infraestrutura, por não coordenar e supervisionar de forma adequada a elaboração do termo de referência e do orçamento-base da Concorrência 20/2010. Acórdão n.º 968/2012-Plenário, TC 002.575/2011-6, rel. Min. Aroldo Cedraz, 25.4.2012.

A participação de duas filiais de dada empresa em pregão eletrônico não configura, por si só, ilegalidade, especialmente quando as circunstancias inerentes ao certame apontam no sentido de não ter havido intenção de frustrar seu caráter competitivo
Representação formulada pela empresa JBS S/A, apontou possíveis irregularidades na condução do Pregão Eletrônico 04/2011-SEDF pela Secretaria de Estado de Educação do Governo do Distrito Federal (SEDF), para registro de preços relacionados ao fornecimento de alimentação para os alunos da rede escolar pública do DF e entidades conveniadas. A autora da representação insurgiu-se contra sua exclusão do certame a despeito de haver apresentado, na fase de lances, os menores preços para três dos itens licitados. O pregoeiro, em resposta à oitiva determinada pelo relator, esclareceu que a empresa JBS S/A fora inabilitada em razão de haver participado da licitação por meio de duas filiais com CNPJs distintos. Argumentou que a existência de sócios comuns de licitantes implicaria quebra do sigilo das propostas e prejudica a isonomia e a competitividade do certame, consoante se pode depreender de deliberação do Tribunal. O relator, apesar de reconhecer que a existência de empresas com sócios comuns “pode constituir indício de conluio para fraudar o certame”, observou que, no caso sob exame, vários licitantes participaram do certame. Entre elas, duas filiais da empresa JBS, que “apresentaram propostas de mesmo valor para os itens em questão, mas somente a filial de CNPJ 02.916.265/011-31 ofertou lances na etapa competitiva do certame, sagrando-se vencedora dos itens 4, 68 e 100”. Considerou não haver indícios de má-fé da empresa, nem que tenha obtido alguma vantagem em decorrência disso. E mais: “a participação de somente uma das filiais na fase de lances afasta a hipótese de conluio, uma vez que essas unidades da mesma empresa não se apresentaram como duas concorrentes frente às outras licitantes”. Por esses motivos, o Tribunal, ao acolher proposta do relator, decidiu: I) determinar à Secretaria de Educação do GDF que “adote providências no sentido de anular os atos de adjudicação dos itens 04, 68 e 100” do Pregão Eletrônico 04/2011-SEDF; II) retorne o processo licitatório à fase de aceitação das propostas, em relação  aos itens 04, 68 e 100, e  proceda à análise das condições de habilitação da empresa JBS S/A. Precedente mencionado: Acórdão 1.793/2011 – Plenário. Acórdão n.º 972/2012-Plenário, TC 001.081/2012-8, rel. Min. Raimundo Carreiro, 25.4.2012.

A comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte nas licitações públicas somente deve ser exigida quando da assinatura do contrato com a Administração, consoante disposto nos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006
Representação de licitante apontou possíveis irregularidades na Tomada de Preços nº 03/2011, conduzida pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - IFRJ, que tem por objeto “a contratação de serviços de reforma do Campus de Arraial do Cabo”. Alegou ter sido afastada indevidamente do certame em decorrência de débito para com a fazenda municipal, uma vez que, por ser microempresa, estaria obrigada a comprovar a regularidade fiscal somente quando da assinatura do respectivo contrato e não no curso do certame.  O relator, em linha de consonância com a unidade técnica, considerou terem sido violados os comandos dos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006, a seguir reproduzidos. Segundo o primeiro deles, “Art. 42. Nas licitações públicas, a comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do contrato”.  E: “Art. 43. As microempresas e empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta apresente alguma restrição. § 1º Havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal, será assegurado o prazo de 2 (dois) dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado o vencedor do certame, prorrogáveis por igual período, a critério da Administração Pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito, e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa” – grifos do relator. Invocou ainda o art. 4º do Decreto nº 6.204/2007, que regulamentou o tratamento favorecido, diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte, que reitera a faculdade de esses agentes comprovarem a regularidade fiscal somente quando da assinatura do respectivo contrato. O Tribunal, principalmente em face dessa ocorrência, ao acolher proposta do relator, decidiu determinar ao IFRJ que adote providências no sentido de anular a Tomada de Preços nº 03/2011 do IFRJ. Acórdão n.º 976/2012-Plenário, TC 034.666/2011-7, rel. Min. José Jorge, 25.4.2012.

A subcontratação integral do objeto pactuado desnatura o certame licitatório e justifica a apenação do agente que a autorizou
Tomada de contas especial apurou indícios de dano ao erário e de outras irregularidades praticadas no âmbito da Superintendência Regional do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes em Rondônia – Dnit/RO, durante a condução das obras de restauração de três trechos da BR-364/RO. O relator, ao acompanhar o MP/TCU, considerou que as alegações de defesas apresentadas pelos responsáveis demonstraram a inexistência de débito. Remanesceu, porém, não justificada a subcontratação integral pela Construtora Queiroz Galvão S/A da Construtora Castilho S/A para execução dos serviços objeto do Contrato PG-210/99-00, que abrangia o subtrecho Ponte do Rio Preto (km 568,8) a Candeias do Jamari (km 700,6). Quanto a esse aspecto, o MP/TCU ressaltou que o art. 78, inciso VI, da Lei 8.666/1993, “estabelece como causa de rescisão contratual a subcontratação de objeto ajustado com a Administração não admitida no contrato e no edital”. Anotou, também, que a subcontratação somente é possível, nos termos do art. 72 da citada lei, “até o limite admitido, em cada caso, pela Administração”. E mais: “A subcontratação integral do objeto ajustado desnatura o certame licitatório destinado à contratação inicial e é repudiada pelo TCU, nos termos da jurisprudência ...”. O relator endossou as conclusões do MP/TCU, no sentido de que o gestor responsável por autorizar a referida subcontratação merecia ser apenado. O Tribunal, então, ao acolher sua proposta, decidiu aplicar ao responsável multa do art. 58, inciso II, no valor de R$ 5.000,00. Precedentes mencionados: Acórdãos 100/2004-TCU e 1748/2004-TCU, ambos do Plenário. Acórdão n.º 954/2012-Plenário, TC 006.095/2004-4, rel. Min. Ana Arraes, 25.4.2012.

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