Plenário
Lei da “Ficha Limpa”
e hipóteses de inelegibilidade - 10
A Lei da “Ficha Limpa” é compatível com a Constituição e pode
ser aplicada a atos e fatos ocorridos anteriormente à edição da LC 135/2010.
Essa a conclusão do Plenário ao julgar procedente pedido formulado em duas ações
declaratórias de constitucionalidade e improcedente o em ação direta de
inconstitucionalidade, todas por votação majoritária. As primeiras foram
ajuizadas pelo Partido Popular Socialista - PPS e pelo Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil, tendo por objeto a integralidade da LC 135/2010
— que alterou a LC 64/90, para instituir hipóteses de inelegibilidade —, e a
última, pela Confederação Nacional das Profissões Liberais - CNPL, em face do
art. 1º, I, m, do mesmo diploma [“Art. 1º São inelegíveis: I - para
qualquer cargo: ... m) os que forem excluídos do exercício da profissão, por
decisão sancionatória do órgão profissional competente, em decorrência de
infração ético-profissional, pelo prazo de 8 (oito) anos, salvo se o ato houver
sido anulado ou suspenso pelo Poder Judiciário”] — v. Informativos 647 e
650. Preliminarmente, reiterou-se que a análise do Colegiado cingir-se-ia às
hipóteses de inelegibilidade introduzidas pela LC 135/2010.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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No mérito, ressaltou-se que o diploma normativo em comento
representaria significativo avanço democrático com o escopo de viabilizar o
banimento da vida pública de pessoas que não atenderiam às exigências de
moralidade e probidade, considerada a vida pregressa, em observância ao que
disposto no art. 14, § 9º, da CF (“Lei complementar estabelecerá outros
casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a
probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada
vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra
a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou
emprego na administração direta ou indireta”). Enfatizou-se, outrossim, que
a norma seria fruto de iniciativa popular, a evidenciar o esforço da população
brasileira em trazer norma de aspecto moralizador para a seara política. Não
obstante, assinalou-se eventual caráter contramajoritário do Supremo, o qual
não estaria vinculado às aspirações populares.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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Assentou-se que os critérios eleitos pelo legislador
complementar estariam em harmonia com a Constituição e que a LC 135/2010
deveria ser apreciada sob a ótica da valorização da moralidade e da probidade
no trato da coisa pública, da proteção ao interesse público. Além disso, os
dispositivos adversados ostentariam o beneplácito da adequação, da necessidade
e da razoabilidade. O Min. Luiz Fux, relator, teceu considerações sobre o
princípio da presunção de inocência e repeliu a alegação de que a norma o
ofenderia. Aduziu que o exame desse postulado não deveria ser feito sob enfoque
penal e processual penal, e sim no âmbito eleitoral, em que poderia ser
relativizado. O Min. Joaquim Barbosa, na assentada anterior, relembrara que
inelegibilidade não seria pena, motivo pelo qual incabível a incidência do
princípio da irretroatividade da lei, notadamente, da presunção de inocência às
hipóteses de inelegibilidade. A Min. Rosa Weber, após escorço histórico sobre o
tema, discorreu que o princípio estaria relacionado à questão probatória no
processo penal, a obstar a imposição de restrições aos direitos dos processados
antes de um julgamento. Sinalizou, todavia, que a presunção de inocência
admitiria exceções por não ser absoluta. Ademais, frisou que o postulado não
seria universalmente compreendido como garantia que perdurasse até o trânsito
em julgado e que irradiaria efeitos para outros ramos do direito. No campo
eleitoral, especialmente no que se refere à elegibilidade, consignou a
prevalência da proteção do público e da coletividade. Explicitou, ainda, que as
inelegibilidades decorreriam de julgamento por órgão colegiado, sem necessidade
de trânsito em
julgado. Esclareceu, no ponto, que a própria lei complementar
teria previsto a possibilidade de correção, por órgão recursal, de eventuais
irregularidades na decisão (“Art. 26-C. O órgão colegiado do tribunal ao
qual couber a apreciação do recurso contra as decisões colegiadas a que se
referem as alíneas d, e, h, j, l e n do inciso I do art. 1º poderá, em caráter
cautelar, suspender a inelegibilidade sempre que existir plausibilidade da pretensão
recursal e desde que a providência tenha sido expressamente requerida, sob pena
de preclusão, por ocasião da interposição do recurso”).
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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Na sequência, a Min. Cármen Lúcia ressurtiu que nos debates da
constituinte, adotara-se o princípio da não culpabilidade penal e que, no caso,
estar-se-ia em sede de direito eleitoral. Relativamente à não exigência de
trânsito em julgado, o Min. Ricardo Lewandowski rechaçou eventual conflito com
o art. 15, III, da CF, ao ponderar que o legislador escolhera por sobrelevar os
direitos previstos no art. 14, § 9º, do mesmo diploma. O Min. Ayres Britto
asseverou que a Constituição, na defesa da probidade administrativa, teria
criado uma espécie de processo legal eleitoral substantivo, que possuiria dois
conteúdos: o princípio da respeitabilidade para a representação da coletividade
e o direito que tem o eleitor de escolher candidatos honoráveis. Arrematou que
a lei complementar seria decorrência da saturação do povo com os maus-tratos
infligidos à coisa pública e que as matérias relativas a retroação, corporação,
órgão colegiado, presunção de inocência já teriam sido exaustivamente debatidas
no Congresso Nacional quando da análise da lei. O Min. Marco Aurélio, por sua
vez, anotou que o conceito alusivo à vida pregressa seria aberto. Aquiesceu ao
elastecimento do prazo de inelegibilidade previsto em alíneas da lei vergastada
e salientou tratar-se de opção político-normativa — a não implicar
inelegibilidade por prazo indeterminado —, a qual não permitiria ao STF atuar
como legislador positivo e adotar, impropriamente, a detração. Mencionou,
ainda, que esta Corte proclamara não poder haver a execução da pena antes do
trânsito em julgado da decisão condenatória e que o preceito não versaria sobre
inelegibilidade.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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Assim, no pertinente à ação declaratória proposta pelo Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (ADC 30/DF), ficaram parcialmente
vencidos os Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Mello e
Cezar Peluso, Presidente. O relator declarava inconstitucionais, em parte, as
alíneas e [“os que forem condenados, em decisão transitada em julgado
ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso
do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes: ...”] e
l [“os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em
decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por
ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio
público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado
até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena”] do
inciso I do art. 1º da LC 64/90, com a redação conferida pela LC 135/2010,
para, em interpretação conforme a Constituição, admitir a redução, do prazo de
8 anos de inelegibilidades posteriores ao cumprimento da pena, do prazo de
inelegibilidade decorrido entre a condenação e o seu trânsito em julgado
(detração).
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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O Min. Dias Toffoli, tendo em conta a aplicação do princípio da
presunção de inocência às causas de inelegibilidade previstas na LC 135/2010,
entendia incompatível com a Constituição vedar a participação no pleito
eleitoral de condenados por suposta prática de ilícitos criminais, eleitorais
ou administrativos, por órgãos judicantes colegiados, mesmo antes da
definitividade do julgado. Razão pela qual declarava a inconstitucionalidade
das expressões “ou proferida por órgão colegiado” contidas nas alíneas d,
[“os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela
Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão
colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político,
para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as
que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes”], e, h [“os
detentores de cargo na administração pública direta, indireta ou fundacional,
que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou
político, que forem condenados em decisão transitada em julgado ou proferida
por órgão judicial colegiado, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados,
bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes”] e l
do inciso I do art. 1º e “ou proferida por órgão colegiado da Justiça
Eleitoral” dispostas nas alíneas j [“os que forem condenados, em
decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça
Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por
doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta
vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do
registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição”] e
p [“a pessoa física e os dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis
por doações eleitorais tidas por ilegais por decisão transitada em julgado ou
proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, pelo prazo de 8 (oito) anos
após a decisão, observando-se o procedimento previsto no art. 22”] do
preceito. Em consequência, enunciava a inconstitucionalidade, por arrastamento:
a) do caput do art. 15; b) da expressão “independente da apresentação
de recurso” inserida no parágrafo único do art. 15; c) dos artigos 26-A e
26-C, caput e §§ 1º, 2º e 3º, todos da LC 64/90, com as alterações
promovidas pela LC 135/2010; e d) do art. 3º da LC 135/2010.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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Além disso, conferia interpretação conforme às alíneas m
e o [“os que forem demitidos do serviço público em decorrência de
processo administrativo ou judicial, pelo prazo de 8 (oito) anos, contado da
decisão, salvo se o ato houver sido suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário”]
do inciso I do art. 1º, I, para esclarecer que a causa de inelegibilidade
somente incidiria após a condenação definitiva no âmbito administrativo, de
forma que o prazo de inelegibilidade começaria a contar a partir da decisão
final administrativa definitiva. Igual solução propugnava quanto à alínea q
[“os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados
compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por
sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na
pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos”],
no intuito de que: a) a expressão “por decisão sancionatória”
pressupusesse decisão administrativa
definitiva e b) o termo “sentença” fosse interpretado como decisão
judicial transitada em julgado, consoante o art. 95, I, da CF. Atribuía
interpretação conforme à expressão “aplicando-se o disposto no inciso II do
art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem
exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”, prevista na parte
final da alínea g [“os que tiverem suas contas relativas ao exercício
de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que
configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível
do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder
Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes,
contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do
art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem
exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”], com o objetivo
de explicar que os Chefes do Poder Executivo, ainda quando atuassem como
ordenadores de despesas, submeter-se-iam aos termos do art. 71, I, da CF. Por
fim, declarava a inconstitucionalidade da alínea n [“os que forem
condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial
colegiado, em razão de terem desfeito ou simulado desfazer vínculo conjugal ou
de união estável para evitar caracterização de inelegibilidade, pelo prazo de 8
(oito) anos após a decisão que reconhecer a fraude”], uma vez que
instituíra ilícito autônomo capaz de gerar, por si, espécie de condenação ou
hipótese autônoma de inelegibilidade.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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O Min. Gilmar Mendes, de início, enfatizava o forte teor simbólico
da lei complementar e, no ponto, vislumbrava não ser possível relativizar
princípios constitucionais para atender anseios populares. Ressaltava a
existência de outros mecanismos postos à disposição dos cidadãos e dos diversos
grupos com o fulcro de impedir a candidatura e a consequente eleição de pessoas
inaptas, sob o enfoque da probidade administrativa e da moralidade para o
exercício do mandato eletivo, a saber: o voto, a escolha de candidatos no
âmbito dos partidos políticos e o controle das candidaturas pelos cidadãos
eleitores, cidadãos candidatos e partidos. Reprochava a dispensa do trânsito em julgado. Enaltecia
que a exigência de coisa julgada para a suspensão de direitos políticos como
sanção em ação de probidade não significaria dispensa da probidade
administrativa ou da moralidade para o exercício de mandato eletivo. Todavia,
consagraria a segurança jurídica como fundamento estruturante do Estado
Democrático de Direito. Em passo seguinte, também dava interpretação conforme a
Constituição à parte final da alínea g, no sentido de que o Chefe do
Poder Executivo, ainda quando atuasse como ordenador despesa, sujeitar-se-ia
aos termos do art. 71, I, da CF. Quanto à alínea m, registrava que essa
disposição traria restrição grave a direito político essencial a ser praticada
por órgãos que não possuiriam competência constitucional para fazê-lo e que
operariam segundo uma miríade de regras disciplinares a dificultar fiscalização
segura e eficiente por parte do Estado. Relativamente à alínea o,
asseverava que, para que se amoldasse à dogmática constitucional de restrição
de direito fundamental, impenderia emprestar interpretação conforme a
Constituição ao dispositivo a fim de restringir a pena de inelegibilidade às hipóteses
de demissão que guardassem conexão direta com a sanção de improbidade
administrativa. Acompanhava o Min. Dias Toffoli no que se referia à alínea n.
No mesmo diapasão, declarava a inconstitucionalidade da expressão “ou
proferida por órgão colegiado” inserta nas alíneas e e l,
pois necessário o trânsito em julgado, além de caracterizado o excesso do
legislador, em ofensa ao princípio da proporcionalidade. Vencido no tópico, acatava
a detração sugerida pelo relator.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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Ao seu turno, o Min. Celso de Mello observava que a iniciativa
popular não poderia legitimar nem justificar a formulação de leis que
transgredissem a Constituição e que pudessem implicar, a partir de sua
incidência, supressão ou limitação de direitos fundamentais, já que estes
comporiam núcleo insuscetível de reforma, até mesmo por efeito de deliberação
do Congresso Nacional quando no desempenho de seu poder reformador. Em seguida,
distinguia inelegibilidade inata — resultante diretamente da existência de certas
situações, a exemplo das relações de parentesco ou conjugais — da cominada —
típica sanção de direito eleitoral que restringiria a capacidade eleitoral
passiva de qualquer cidadão, na medida em que o privaria, mesmo que
temporariamente, do exercício de um direito fundamental, qual seja, o de
participação política. Abordava a questão da presunção de inocência, no sentido
de não admitir a possibilidade de que decisão ainda recorrível pudesse gerar
inelegibilidade. Confirmava a validade constitucional das alíneas c, d,
f, h, j, p e q do inciso I do art. 1º da LC
135/2010. Relativamente à alínea g, na mesma linha dos votos proferidos
pelos Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes, dava interpretação conforme, de
sorte que o inciso II do art. 71 da CF fosse aplicado a todos os ordenadores de
despesa, mas elucidava que o Chefe do Executivo, ainda quando atuasse nessa
condição de ordenador de despesas, submeter-se-ia ao tribunal de contas e ao
Poder Legislativo, nos termos do inciso I da citada norma constitucional.
Acatava a interpretação conforme atribuída pelo Min. Dias Toffoli no que dizia
respeito às alíneas m e o, contudo, acrescentava a esta última,
consoante defendido pelo Min. Gilmar Mendes, a necessidade de que a demissão do
serviço público guardasse conexão com atos de improbidade administrativa.
Assentava, ainda, a inconstitucionalidade das alíneas e e l. Por
derradeiro, vencido na parte referente à presunção de inocência, acolhia a
proposta do relator no tocante à detração, bem como sua formulação original
quanto à alínea k [“o Presidente da República, o Governador de Estado
e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das
Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que
renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição
capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da
Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito
Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem
durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8
(oito) anos subsequentes ao término da legislatura”] com o fito de que
compreendesse somente a renúncia efetivada após a instauração de processo, não
em face de mera representação ou de simples denúncia que qualquer cidadão
pudesse fazer à Câmara contra o Presidente da República ou deputado.
ADC 29/DF, rel. Min.
Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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O Presidente dessumiu que, para a presunção de inocência, não
importaria que as medidas gravosas ou lesivas fossem de ordem criminal ou não,
haja vista que se objetivaria preservar a condição do réu, enquanto não
julgado, de não ser tratado como coisa. Logo, se não condenado, nenhuma medida
restritiva em sua esfera jurídica lhe poderia ser imposta com base em juízo de
culpabilidade ainda não formado em caráter definitivo. Seguia o Min. Gilmar
Mendes, no concernente à alínea m, ao fundamento de que a causa de
inelegibilidade vinculada a decisões de órgãos corporativos e profissionais
conferiria a ente não estatal o poder de retirar um direito público subjetivo,
que deveria ser tratado no campo da área pública. Assentia com as
inconstitucionalidades por arrastamento sugeridas pelo Min. Dias Tofolli e, no
mais, acompanhava-o integralmente.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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No tocante à ação declaratória ajuizada pelo PPS (ADC 29/DF) —
na qual requerida também a incidência do diploma adversado a atos e fatos
jurídicos anteriores ao seu advento —, o Min. Luiz Fux afirmou que a
consideração desses, para fins de aplicação da LC 135/2010, não macularia o
princípio constitucional da irretroatividade das leis. O Min. Dias Toffoli, ao
destacar a inexistência de direito adquirido a regime jurídico de
elegibilidade, reputou que a aplicação do diploma não diria respeito à
retroatividade ou a novas causas de inelegibilidade, mas sim à incidência em
processos eleitorais vindouros, cujo marco temporal único para o exame das
condições de elegibilidade seria o registro da candidatura. Se assim não fosse,
ter-se-ia duplo regime jurídico de inelegibilidades num mesmo processo
eleitoral, a concorrer candidatos submetidos à LC 135/2010 e outros, à
legislação anterior. Sublinhou que, se uma norma passasse a exigir novas
condições para que alguém fosse candidato, essa inovação, não obstante pautada
em fato pretérito, somente deveria valer para processos eleitorais futuros,
visto que a criação de novo critério selecionador de condições subjetivas de
elegibilidade — que, necessariamente, operar-se-ia para o futuro —, buscaria
esses requisitos no passado. Concluiu que o princípio da anterioridade
eleitoral (CF, art. 16) evitaria a criação de cláusulas de inelegibilidade
casuísticas. Nesse contexto, a Min. Rosa Weber vislumbrou que a elegibilidade
seria condição a ser averiguada por ocasião de cada pleito eleitoral segundo a
lei da época, não havendo que se falar em direito adquirido. Ademais, as
hipóteses de inelegibilidade consagradas na norma em tela teriam caráter geral
e aplicar-se-iam a todos, para o futuro, ou seja, apenas para as próximas
eleições.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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A Min. Cármen Lúcia realçou que o que se passaria na vida de
alguém não se desapegaria de sua história, de forma que, quando um cidadão se
propusesse a ser o representante dos demais, a vida pregressa comporia a persona
que se ofereceria ao eleitor e seu conhecimento haveria de ser de interesse
público, a fim de se chegar à conclusão de sua aptidão — que a Constituição
diria moral e proba — para esse mister. O direito marcaria, traçaria a etapa e
os dados dessa vida passada que precisariam ser levados em conta. Apontou que
a norma impugnada pregaria e confirmaria cada qual dos princípios
constitucionais. O Min. Ricardo Lewandowski rememorou inexistir retroatividade,
porquanto não se cuidaria de sanção, porém de condição de elegibilidade. O Min.
Ayres Britto citou que a Constituição, em seu § 9º do art. 14, teria autorizado
a lei complementar a criar, estabelecer requisitos (pré-requisitos) de
configuração do direito de se candidatar. Não dissera restrições ao exercício
de direito. Seriam, ao contrário, pressupostos que, se não preenchidos,
afastariam o próprio direito à candidatura.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
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Vencido o relator, que julgava o pleito parcialmente
procedente, nos termos já explicitados. Vencidos, em maior extensão, os
Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Presidente, que, por
rejeitarem a retroação, reputavam-no improcedente. O primeiro acentuava o
caráter retroativo da lei complementar e determinava sua aplicação apenas aos
fatos ocorridos após a sua vigência, respeitada a anualidade eleitoral (CF,
art. 16). O segundo, tendo em conta o princípio da segurança jurídica, aludia
ser cláusula pétrea o respeito às situações aperfeiçoadas nos termos da
legislação da época, de forma que a lei seria válida e abarcaria atos e fatos
que tivessem ocorrido após junho de 2010. Abordava que, se assim não fosse,
aqueles que claudicaram deveriam ter tido uma premonição quanto a vinda à balha
dessa lei. O terceiro afastava a incidência dessas novas hipóteses de
inelegibilidade a contextos pretéritos, bem como desses novos prazos, dilatados
de três para oito anos. Advertia que o reconhecimento da possibilidade de o legislador
imputar a situações já consumadas e aperfeiçoadas no passado, conforme o
ordenamento positivo então vigente, a irradiação de novo e superveniente efeito
limitador do direito fundamental de participação política, importaria em ofensa
à cláusula inscrita no art. 5º, XXXV, da CF. Reconhecia que esta teria por
finalidade impedir formulações casuísticas ad personam ou ad hoc
de leis, considerados fatos pretéritos conhecidos do legislador. Por sua vez, o
último manifestava que a extensão de efeitos restritivos para atos jurídicos stricto
sensu cometidos no passado trataria os sujeitos desses atos como
absolutamente incapazes, ao abstrair a vontade na sua prática e a esta atribuir
um efeito jurídico. Além disso, transformar-se-ia a lei em ato estatal de caráter
pessoal, de privação de bem jurídico de pessoas determinadas, a caracterizar
confisco de cidadania.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
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Ao cabo, no que concerne à ação direta, repeliu-se a alegação
de inconstitucionalidade da alínea m, ao fundamento de que, em suma, a
condenação por infração ético-profissional demonstraria a inaptidão para
interferência em gestão da coisa pública. Vencidos os Ministros Dias Toffoli,
Celso de Mello e Presidente, que julgavam o pedido parcialmente procedente
pelas razões já referidas. Vencido, integralmente, o Min. Gilmar Mendes, que
declarava a pretensão procedente, na íntegra, pois a permissão concedida
atentaria contra o direito, pela insegurança jurídica que geraria, ao conferir
a decisão disciplinar de órgão de controle profissional eficácia de restrição a
direitos políticos.
ADC 29/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-29)
ADC 30/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADC-30)
ADI 4578/DF, rel. Min. Luiz Fux, 15 e 16.2.2012. (ADI-4578)
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