Informativo STF


Estatuto de Defesa do Torcedor - 1
O Plenário julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Partido Progressista - PP, contra o inciso I do art. 8º; o § 5º, I e II, do art. 9º; o § 4º do art. 10; as expressões “em até vinte e quatro horas contadas do término da partida”, contida no caput, e “em até vinte e quatro horas após o seu término”, inserta no § 1º, bem assim os §§ 2º a 6º do art. 11; o art. 12; o art. 19; o parágrafo único do art. 30; o caput e os §§ 1º e 2º do art. 32; os incisos II e III do parágrafo único do art. 33; os incisos I e II, o § 1º, II, e o § 3º do art. 37, todos da Lei 10.671/2003, que dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor e dá outras providências. De início, esclareceu-se que o objeto da ação não estaria prejudicado, porquanto as diversas modificações introduzidas no diploma especificado pela Lei 12.299/2010 em nada atingiriam o teor e o alcance dos dispositivos em tela.
ADI 2937/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2012. (ADI-2937)

Estatuto de Defesa do Torcedor - 2
No tocante ao argumento de que a União extravasara sua competência legislativa, asseverou-se que o Estatuto do Torcedor não deixaria de ser um conjunto ordenado de normas de caráter geral. Enfatizou-se que nele não se trataria de peculiaridades locais, de especificidades ou singularidades estaduais ou distritais, tampouco se cuidaria de particularidades ou minudências que pudessem estar reservadas à dita competência estadual concorrente não cumulativa ou suplementar do art. 24, § 2º, da CF. Complementou-se que a União teria exercido a competência estatuída no inciso IX do art. 24 sem dela desbordar, em se adstringindo a regular genericamente a matéria. Ressaltou-se ser evidente que os preceitos expedidos não poderiam reduzir-se, exclusivamente, a princípios gerais, sob pena de completa inocuidade prática. Avaliou-se que não se despiram, em nenhum aspecto, de sua vocação genérica, nem correram o risco de se transformar em simples recomendações. Introduziriam diretrizes, orientações e, até, regras de procedimentos, todas de cunho geral, diante da impossibilidade de se estruturar, normativamente, o subsistema jurídico-desportivo apenas com apoio em princípios. Explicitou-se que a lei em comento guardaria, em certas passagens, índole metanormativa, porque, ao visar à proteção do espectador, ditaria regras sobre a produção de regulamentos. Assinalou-se que nenhum intérprete racional poderia ter convicção sincera de que uma legislação federal, sobre competições esportivas, pautada pelo uso de substantivos abstratos pudesse atingir um mínimo de efetividade social, sem prever determinados aspectos procedimentais imanentes às relações da vida que constituíssem a experiência objeto da normação. No ponto, salientou-se que, ainda nos dispositivos mais pormenorizados — como o art. 11, sobre súmulas e relatórios das partidas —, existiria clara preocupação com o resguardo e o cumprimento de objetivos maiores do Estatuto, à luz do nexo de instrumentalidade entre regras e princípios. Além disso, o fato de aplicar-se à generalidade dos destinatários seria providência fundamental nas competições de caráter nacional, que não poderiam estar relegadas ao alvedrio de leis estaduais fortuitas, esparsas, disformes e assistemáticas. Após acentuar-se que a Lei 10.671/2003 destinar-se-ia a reger ações tão somente no plano do desporto profissional, inferiu-se que a própria Constituição imporia essa distinção (“Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados: ... III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não- profissional”). Assim, assentou-se que o discrímen na regulação seria mais que legítimo, sem que as regras deixassem de estar, nesse âmbito de incidência, revestidas de generalidade.
ADI 2937/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2012. (ADI-2937)

Estatuto de Defesa do Torcedor - 3
No que tange à autonomia das entidades desportivas, ao direito de livre associação e à não intervenção estatal, rememorou-se o entendimento da Corte segundo o qual nenhum direito, garantia ou prerrogativa ostentaria caráter absoluto. Em seguida, afirmou-se que a disposição sobre a autonomia das associações não teria caráter absoluto em nenhuma circunstância. Verificou-se que se deveria conceber o esporte como direito individual, não se afigurando viável interpretar o caput do art. 217 da CF — que consagra textualmente o direito de cada um ao esporte — à margem e com abstração de seu inciso I, onde constaria a autonomia das entidades desportivas. Sublinhou-se que, na medida em que definido e compreendido como objeto de direito do cidadão, o esporte emergiria, com nitidez, na condição de bem jurídico protegido pelo ordenamento, que se sujeitaria àquele primado do direito individual ao esporte. Dessumiu-se que seria imprescindível ter-se em conta, na análise das cláusulas impugnadas, a legitimidade da imposição de limitações à autonomia desportiva como exigência do prestígio e garantia do direito ao desporto, constitucionalmente reconhecido. Registrou-se que o diploma adversado homenagearia, entre outras coisas, o direito do cidadão à vida, à integridade e à incolumidade física e moral, inerentes à dignidade da pessoa humana, à defesa de sua condição de consumidor, ao lazer e à segurança. Clarificou-se que os preceitos contestados teriam por objetivo evitar ou pelo menos reduzir, em frequência e intensidade, episódios e incidentes como brigas em estádios, violência, morte e barbárie entre torcidas. Situação que, decerto, seria mais caótica e preocupante se o diploma não estivesse em vigor. No que concerne ao alegado desrespeito a direitos e a garantias individuais, anotou-se que não se vislumbraria sequer vestígio de ofensa aos incisos X (intimidade, honra, imagem dos dirigentes), LIV (devido processo legal), LV (contraditório e ampla defesa), LVII (proibição de prévia consideração de culpabilidade) e § 2º do art. 5º da CF. No tocante ao devido processo legal, evidenciou-se, também, que estaria textualmente invocado no art. 37, caput, do Estatuto.
ADI 2937/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2012. (ADI-2937)

Estatuto de Defesa do Torcedor - 4
Ato contínuo, relativamente à responsabilização objetiva, prevista em seu art. 19, apontou-se que decorreria da expressa equiparação das entidades desportivas, consoante o art. 3º da mesma lei, à figura do fornecedor do CDC. A equiparação não seria apenas obra dela, mas conclusão necessária da relação jurídica que enlaçaria os eventos desportivos profissionais e os torcedores. Consignou-se que não haveria falar, igualmente, em indevida imposição de sanção dupla, desproporcional ou irrazoável, haja vista que as penalidades do art. 37 seriam textualmente aplicáveis a hipóteses diversas, à vista da gravidade das condutas, segundo consideração do legislador. O inciso I do art. 37 preveria destituição por violação das regras dos Capítulos II (transparência na organização), IV (segurança do torcedor) e V (ingressos), enquanto o inciso II diria respeito aos demais dispositivos do diploma que pudessem ser violados. Por sua vez, o afastamento prévio e compulsório dos dirigentes e de outras pessoas que, de forma direta ou indireta, pudessem comprometer ou prejudicar a completa elucidação dos fatos, encontraria sua ratio iuris na necessidade de assegurar resultado útil ao processo de investigação e somente determinado pelo órgão competente, donde não constituiria sanção, mas autêntica medida cautelar que, compatível com a Constituição, seria regulada em várias áreas do direito. Aduziu-se não haver, nesse instituto, contrariedade alguma à chamada presunção constitucional de inocência, da mesma maneira que as hipóteses de prisão cautelar não ofenderiam esse princípio. Mensurou-se que, conforme advertira a AGU, ao indicar punições por desrespeito às normas de direito público, inafastáveis por interesses particulares, os preceitos guardariam plena e equilibrada relação de causa e efeito, mediante apuração em devido processo legal, perante juiz de direito. Do ponto de vista extrajurídico, observou-se que a legislação, além de tutelar diretamente o torcedor, favoreceria indiretamente — mesmo porque não estabeleceria normas tendentes a alterar o funcionamento e a organização administrativa das entidades — o aperfeiçoamento das instituições, ao incentivar-lhes a profissionalização e a busca da eficiência na gestão es­portiva, com benefício a toda a sociedade. Por fim, elucidou-se que o art. 8º, I, do estatuto, garantiria às entidades de prática desportiva a participação em competições durante pelo menos dez meses do ano, sem obrigá-las. Não haveria nisso ofensa ao texto constitucional.
ADI 2937/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2012. (ADI-2937)

Estatuto de Defesa do Torcedor - 5
Ao seu turno, o Min. Luiz Fux manifestou haver numerosos instrumentos de defesa dos dirigentes. Além disso, os dispositivos de forma alguma teriam interferência na vida interna corporis das entidades associativas e das agremiações e, mutatis mutandis, a lei seria um código de defesa do torcedor. O Min. Ayres Britto versou que as práticas desportivas colocar-se-iam numa linha de intersecção com a economia, a cultura brasileira, o exercício de profissões e a defesa do consumidor, sendo a totalidade destes de lastro constitucional. O Min. Gilmar Mendes enfocou que a Constituição, ao tratar do desporto, estabeleceria visivelmente um dever geral de proteção. Acrescentou que seria um setor que, realmente, chamaria atenção por suas singularidades. Expôs ser a área do desporto, e sua autonomia, seara em que a autopoiése realizar-se-ia de maneira muito forte e citou como exemplo o poder da FIFA, que conseguiria conglomerar número elevado de países, fixaria regras mais ou menos uniformes e teria grande poder coativo. O Min. Celso de Mello aludiu à posição de absoluta vulnerabilidade do torcedor. No particular, expressou que, na verdade, a função da regra de direito, que consagraria a responsabilidade civil, solidária e objetiva, teria muito mais o propósito de inibir os abusos que se registrassem e de impor um comportamento adequado, a que se deveria ajustar a conduta de cada um dos dirigentes desportivos. Certificou que a previsão de sanções não incorreria na regra que veda o bis in idem, visto que seriam distintas as esferas de responsabilidade. Alfim, indicou que o princípio constitucional da liberdade de associação não inibiria o poder de conformação legislativa do Es­tado e não conferiria às associações, inclusive as desportivas, a prerrogativa de agirem à revelia das regras e princípios jurídicos gravados nas leis e, notadamente, na Constituição. Precedente citado: ADI 3045/DF (DJe de 1º.6.2007).
ADI 2937/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2012. (ADI-2937)

ICMS: operação interestadual e comércio eletrônico - 1
O Plenário referendou medida cautelar concedida pelo Min. Joaquim Barbosa em ação direta de inconstitucionalidade, da qual relator, para suspender a aplicação da Lei 9.582/2011, do Estado da Paraíba. A norma questionada cuida da exigência de parcela do ICMS, nas operações interestaduais que destinem mercadorias ou bens a consumidor final, cuja aquisição ocorrer de forma não presencial, e dá outras providências. Explicou-se que, em síntese, o diploma legal impugnado outorgaria à mencionada unidade estatal competência para cobrar ICMS nas operações interestaduais em que o destinatário estivesse localizado em seu território, independentemente de se tratar de consumidor final — contribuinte do tributo — ou mero intermediário. Na sequência, destacou-se que essa legislação seguiria modelo aprovado no Protocolo ICMS 21/2011, do Confaz, adotado por alguns Estados-membros da Federação e pelo DF, com o objetivo de neutralizar a alegada injustiça do modelo de tributação estabelecido pela Constituição. Reputou-se que, aparentemente, este tornar-se-ia injusto à medida que crescesse a intensidade das operações intermediárias por sistema eletrônico de comunicação remota, isto é, o chamado comércio eletrônico. Consignou-se haver, no presente feito, a mesma densa probabilidade de procedência constante da ADI 4565 MC/PI (DJe de 27.6.2011), em razão da simetria entre os quadros fático-jurídicos examinados. Relativamente ao risco à prestação jurisdicional pelo decurso de tempo, anotou-se que essa espécie de legislação retaliatória alastrar-se-ia pela Federação, com base no protocolo especificado. Enfatizou-se que seria impossível alcançar integração nacional sem harmonia tributária e que o modelo, adequado ou não, escolhido pelo constituinte de 1988, para prover essa conformidade e a indispensável segurança jurídica, fixar-se-ia na “regra de origem”. À primeira vista, aduziu-se que o Confaz ou cada um dos Estados-membros singelamente considerados não poderiam substituir a legitimidade democrática da Assembleia Constituinte, nem do constituinte derivado, na determinação dessa regra.
ADI 4705 Referendo-MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 23.2.2012. (ADI-4705)

ICMS: operação interestadual e comércio eletrônico - 2
Além da segurança jurídica institucional, assinalou-se que a retaliação unilateral prejudicaria o elemento mais fraco da cadeia de tributação, que seria o consumidor. Discorreu-se que, como a pessoa que suportaria a carga econômica do tributo, não teria, em tese, legitimidade para pleitear a restituição, e se costumaria exigir dos vendedores a obtenção de autorização individual dos consumidores para formulação desse pedido, a tendência seria que o recolhimento indevido se tornasse fato consumado de dificílima reversão. Acrescentou-se não haver risco de irreversibilidade dos efeitos da cautelar, porque assegurado ao Estado da Paraíba o direito de lançar — respeitado o devido processo legal — os créditos tributários que entendesse devidos para evitar, por exemplo, a decadência. Por fim, o relator informou que a decisão concentrar-se-ia basicamente na grave questão federativa e que não caberia a Estado-membro dispor sobre a matéria e, muito menos, fazê-lo de forma retaliatória. O Min. Gilmar Mendes acentuou a relevância da matéria tratada a envolver e-commerce, no qual haveria mudança de paradigmas. Situação associada ao problema tecnológico, haja vista que as atividades dessas empresas poderiam concentrar-se em certa unidade federada e, com isso, esvaziar as demais. Vislumbrou que, tendo em conta mudança de quadro fático, ter-se-ia contexto a afetar o próprio equilíbrio federativo. Registrou, por derradeiro, que se deveria buscar algum modelo jurídico para a espécie. Os Ministros Luiz Fux e Ayres Britto sinalizaram, de igual modo, preocupação com o tema. ADI 4705 Referendo-MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 23.2.2012. (ADI-4705)

Inquérito e redução a condição análoga à de escravo - 4
Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, recebeu denúncia oferecida contra senador da República e outro denunciado pela suposta prática dos tipos penais previstos nos artigos 149; 203, §§ 1º e 2º; e 207, §§ 1º e 2º, todos do CP, em concurso formal homogêneo. No caso, a inicial acusatória narra que, a partir de diligência realizada por grupo de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE, constatara-se que os denunciados teriam, no período de janeiro e fevereiro de 2004, reduzido aproxi­madamente 35 trabalhadores a condição análoga à de escravos, inclusive com a presença de menor de idade entre eles, nas dependências de fazenda de propriedade do parlamentar e administrada pelo co-denunciado — v. Informativo 603. Salientou-se que a existência de processo trabalhista não afastaria o juízo de admissibilidade da peça acusatória, considerada a independência entre a instância trabalhista e a penal. Reiterou-se que a investigação fora realizada por grupo que contara com a atuação de auditores fiscais do trabalho, de procurador do Ministério Público do Trabalho, de delegado e de outros agentes do Departamento de Polícia Federal. Observou-se a edição de leis que alteraram a disciplina referente aos crimes relacionados à organização do trabalho e à liberdade pessoal no exercício de atividade laboral, notadamente a Lei 9.777/98 — que ampliara o rol de condutas passíveis de enquadramento em crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, inclusive com a previsão da prática do truck system (forma de pagamento de salário em mercadorias), que ocorreria no caso, pois haveria armazéns na propriedade para fornecimento de produtos e mercadorias aos trabalhadores mediante desconto dos valores no salário — e a Lei 10.803/2003 — que estendera o rol de condutas amoldadas ao delito de redução a condição análoga à de escravo. Enfatizou-se que os atos descritos atentariam contra o princípio da dignidade humana, sob o prisma do direito à liberdade e ao trabalho digno. O Min. Luiz Fux destacou inexistir responsabilidade penal objetiva, porque os denunciados estariam na posição de garantes do bem jurídico protegido. Assim, firmados os documentos contratuais com os trabalhadores, a responsabilidade sobre eles teria sido assumida pelos réus e seria compreensível na tipificação dos crimes comissivos por omissão.
Inq 2131/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 23.2.2012. (Inq-2131)

Inquérito e redução a condição análoga à de escravo - 5
Entendeu-se possível a coexistência dos crimes dos artigos 149, 203 e 207, todos do CP, sem consunção. Relativamente ao delito de redução a condição análoga à de escravo (CP, art. 149), consignou-se que a aludida fiscalização demonstraria a precária situação de labor a que os trabalhadores estariam submetidos e que cópias de lançamentos contábeis evidenciariam dívidas assumidas por vários deles no armazém mantido no local. Considerou-se que a imputação referente ao crime do art. 207 do CP, na modalidade de recrutamento de trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, não garantindo condições de seu retorno ao local de origem, também encontraria substrato probatório. Assinalou-se que a fraude descrita consistiria em promessas de salários e de outros benefícios por ocasião do contrato. Quanto ao crime descrito no art. 203 do CP, referente a frustração, mediante fraude, de direitos assegurados pela legislação trabalhista, destacou-se a lavratura de autos de infração por parte dos auditores do MTE, em face da ausência de formalização de contrato de trabalho.
Inq 2131/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 23.2.2012. (Inq-2131)

Inquérito e redução a condição análoga à de escravo - 6
Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio, que rejeitavam a denúncia; e Cezar Peluso, Presidente, que a recebia parcialmente. O Min. Gilmar Mendes registrava que o relatório apresentado, quando da atuação fiscalizadora no local, não teria apenas noticiado fatos objetivos, mas conteria juízos subjetivos por parte de seus subscritores. Afirmava necessário distinguir o que seria irregular, a exigir corrigendas no âmbito administrativo, e o que mereceria imputação criminal. Nesse sentido, a questão resumir-se-ia na razoabilidade de se convolar em crime os fatos imputados, visto que se imaginar a estrutura de saneamento e habitação exigida para que os trabalhadores não sofressem situações degradantes, nos moldes da denúncia, poderia significar fuga da realidade. Aduzia que as condições de vida das regiões pau­pérrimas do Brasil repetir-se-iam também no trabalho, de maneira que não seria razoável qualificá-las de criminosas por essa exclusiva razão. Não obstante, reconhecia a necessidade de se combater a miséria, o subemprego e a violação aos direitos trabalhistas e sociais. O Min. Dias Toffoli reforçava inexistir coação para que os trabalhadores permanecessem no local. O Min. Marco Aurélio sublinhava que os tipos penais em questão não admitiriam forma culposa e que não se poderia cogitar de contração de dívidas, dado o exíguo período de prestação de serviços — cerca de um mês. Além disso, asseverava não haver fraude ou violência quando da suposta frustração dos direitos trabalhistas por parte dos denunciados. O Presidente, por seu turno, consignava que o requisito do dolo estaria preenchido, uma vez que existente o domínio da ação ou das ações finais por parte do parlamentar denunciado, pois dono da empresa e conhecedor da situação. Assim, recebia a denúncia apenas quanto ao delito previsto no art. 149, caput, do CP, com relação a dois atos específicos: a sujeição a condições degradantes de trabalho — especialmente as de habitação, iluminação e higiene — e a restrição à locomoção dos trabalhadores em razão de dívida com o empregador, que teria criado, ardilosamente, situação apta a torná-lo credor, por meio de salários irrisórios e de exigência de valores desproporcionais por bens necessários à subsistência.
Inq 2131/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 23.2.2012. (Inq-2131)

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