O Art. 65, §1º da Lei de Licitações fixa os limites percentuais para
as alterações contratuais realizadas pela Administração Pública. De
acordo com o supracitado dispositivo legal tais limites devem ser
calculados com base no valor inicial atualizado do contrato.
Aparentemente, a interpretação do mencionado comando normativo não
apresenta grandes dificuldades, vez que os percentuais são objetivamente
definidos na lei e aplicados sobre uma base de cálculo existente em
qualquer contrato administrativo.
Entretanto, ao verificar a incidência do dispositivo legal, ora em
comento, ao caso concreto, percebem-se dificuldades em identificar qual
deve ser o valor inicial atualizado da avença para poder realizar o
cálculo do limite de alteração.
Sem entrar no mérito da questão sobre a aplicabilidade ou não do
limite fixado no Art. 65, §1º da Lei nº 8.666/1993 tanto para as
alterações qualitativas[1]
– Art. 65, I, “a” – quanto para as alterações quantitativas – Art. 65,
I, “b” – o fato é que o cômputo do percentual gera dúvidas em ambas as
situações.
Para melhor visualizar o tema, analisaremos a questão relativa às
alterações contratuais nos contratos de prestação de serviços contínuos.
Isso porque tanto a jurisprudência quanto a doutrina especializada já
se debruçaram sobre o tema.
O Tribunal de Contas da União ao examinar caso que envolvia a
verificação do percentual de alteração contratual quantitativa nessa
espécie de contrato, entendeu que a base de cálculo deve ser o valor
original da avença, sem qualquer acréscimo oriundo das prorrogações.
“20. No caso sob exame, os acréscimos de valor se
deveram a alterações quantitativas de objeto e não simplesmente a
sucessivas prorrogações de serviços contínuos. Assim, nos termos
do art. 65 da Lei de Licitações, o cálculo do limite previsto nos §§ 1º
e 2º do dispositivo, deve tomar como base o valor inicial atualizado do
contrato, sem os acréscimos advindos das prorrogações.” (TCU, Acórdão nº 1.550/2009-Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DJ 15.07.2009)
Em outras palavras, conforme entendimento da Corte de Contas, o valor
inicial atualizado do contrato de prestação de serviço contínuo é a
remuneração original, reajustada ou revisada, contida na proposta
apresentada pelo contratado durante a fase de licitação.
Exemplificando, se o contrato de prestação de serviço contínuo foi
pactuado por um valor hipotético de 100, e foi, posteriormente,
prorrogado cinco vezes, o valor global da contratação será de 500. Nessa
linha, para fins de cálculo do percentual de alteração, a Administração
deverá considerar não o valor 500, mas sim o valor 100, atualizado
–reajustado ou revisado -, para aplicar o limite contido no Art. 65, §1º
da Lei de Licitações.
Em contrapartida, Marçal Justen Filho[2]
aduz que, na hipótese acima referida, a base de cálculo do percentual
de alteração deverá ser o valor total da avença, consideradas, portanto,
todas as prorrogações.
Nas palavras do aludido autor “Uma situação específica
verifica-se no tocante aos contratos objeto de renovação periódica, tal
como se passa com aqueles disciplinados no Art. 57, II. Para efeito de
aplicação do limite de 25%, deverá tomar-se o valor original (reajustado
e revisto) da contratação, multiplicado pelo número de períodos, em que
ocorrer a renovação. (…) Sendo obrigatório o somatório dos valores
correspondentes ao total dos períodos previstos para a vigência do
contrato, o limite de 25% será calculado sobre o valor global
(devidamente atualizado e, se for o caso, revisto). Assim, se o contrato
for pactuado por sessenta meses, com valor de 500, o limite de 25% não
incidirá sobre o valor de cada doze meses (100).”
Joel de Menezes Niebuhr[3],
por sua vez, opta por interpretação diversa das supramencionadas.
Segundo o referido doutrinador, a base de cálculo do limite das
alterações contratuais, referentes aos contratos de serviços contínuos,
deve ser o valor da prestação mensal devida por conta da execução do
serviço.
Para explicar sua opinião, o autor exemplifica com a seguinte situação: “Retomando
o exemplo carreado acima, o prazo de execução do contrato de prestação
de serviço de vigilância estende-se de 1° de Janeiro a 31 de dezembro.
Como dito, o valor total anual é de R$ 1.200.000,00, em 12 parcelas
mensais de R$ 100.000,00. Se a porcentagem que serve de limite for
calculada sobre o valor mensal, nenhuma parcela poderá exceder à soma de
R$ 125.000,00, que corresponde a R$ 100.000,00 acrescido de 25%, limite
preconizado no §1º do Art. 65 da Lei nº 8.666/1993. Se a
porcentagem que serve de limite for calculada sobre o valor total,
algumas parcelas podem mais do que dobrar de valor. (…)É evidente que
aditivo contratual que dobre ou triplique a efetiva parcela do contrato é
excessiva, vulnerando o princípio da proporcionalidade. É
contrário ao aludido princípio, continuando no exemplo, que parcela
mensal de serviço prestado por R$ 100.000,00 transforme-se, de
cambulhada, em R$ 200.000,00 ou mais. Insista-se que isso seria
excessivo, feriria de morte o princípio da proporcionalidade e
revelaria, ao fim e ao cabo, que a Administração não planejou
adequadamente suas demandas.”
Depreende-se dos posicionamentos acima citados, grande divergência a
respeito de qual deve ser o entendimento mais adequado para a
determinação legal do limite de alteração estipulado no Art. 65, §1º da
Lei de Licitações sobre os contratos de prestação de serviços contínuos.
Ao que parece, o mais razoável é considerar o valor relativo ao
último período contratual de vigência, devidamente atualizado –
reajustado ou revisado -, como base de cálculo para o limite das
alterações relativas aos contratos de prestação de serviço contínuos.
Contudo, ainda que restem dúvidas sobre qual deve ser o melhor entendimento acerca do elemento normativo “valor inicial atualizado do contrato”,
contido no Art. 65, §1º da Lei nº 8.666/1993, para os contratos de
prestação de serviços contínuos, a Administração Pública deve buscar a
solução mais adequada ao interesse público primário envolvido no caso
concreto, levando em consideração os princípios da razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, legalidade e eficiência, encartados no
Art. 37 da Constituição da República.
Frise-se que essas divergências não pairam apenas sobre os contratos
de serviços contínuos, mas também sobre os contratos de obras e serviços
de engenharia, de contratos com valores estimados, dentre outros, os
quais serão oportunamente analisados nesse espaço.
Por ora, o enfoque acima deduzido – serviços contínuos – é suficiente para demonstrar a profundidade do tema.
Diante desse cenário, qual sua opinião sobre o assunto? Dê sua opinião. Participe dos debates propostos neste Blog!
[1]
De acordo com o TCU as alterações contratuais qualitativas devem
respeitar os limites percentuais fixados no Art. 65, §1º da Lei nº
8.666/1993 No entanto, em casos excepcionais, é possível ultrapassar
tais limites legalmente previstos, desde que sejam preenchidos
determinados pressupostos e a alteração seja realizada de forma
consensual. No mesmo sentido entendem Marçal Justen Filho e Carlos Ari
Sundfeld. Joel de Menezes Niebuhr entende que tanto as alterações
qualitativas consensuais quanto unilaterais podem ultrapassar o limite
legal. Por outro lado, Adilson Abreu Dallari afirma que a Administração
deve observar o limite, obrigatoriamente, tanto para as alterações
qualitativas quanto quantitativas.
[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2008. São Paulo. Dialética p.738-739.
[3] NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contratos Administrativos.2011. Belo Horizonte. Editora Fórum. p. 844.
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