Jurisprudência de licitações e contratos


PRIMEIRA CÂMARA

1. Eventuais vantagens auferidas pela contratada decorrentes da subcontratação de cooperativa de trabalho, apesar de a avença prever pessoal sob o regime de CLT, não representam prejuízo para a Administração, pois, se não houver expressa disposição acordada em contrário, dizem respeito exclusivamente à gestão de custos da empresa contratada e ao relacionamento desta com terceiros
Embargos de Declaração de consórcio de empresas contra decisão, em Tomada de Contas Ordinária, que determinara à Eletronorte a adoção de medidas para obter o ressarcimento de prejuízo decorrente de pagamentos que embutiam encargos incidentes sobre a remuneração de pessoal contratado sob o regime previsto na CLT, a despeito de a contratada não ter incorrido em tais despesas, por ter subcontratado cooperativa de trabalho para se desincumbir dos serviços. Ao dissentir do posicionamento da unidade técnica, o MP/TCU opinou pelo acolhimento dos Embargos, dando-lhes efeito infringente, mas por razões distintas das alegadas pela recorrente. Alinhando-se no essencial ao Parquet, o relator entendeu que a determinação combatida encontra-se conflitante com a jurisprudência mais recente do Tribunal no que concerne ao limite da vinculação do contratado à composição de custos que apresentou à administração quando da participação em certame licitatório. De acordo com os precedentes citados: não traduz prejuízo para a Administração o fato de o contratado não efetuar pagamentos, em favor de seus empregados, de benefícios cotados em sua planilha de custos, se esses benefícios representarem não insumos dos serviços contratados pela administração, mas apenas extensão da política remuneratória praticada pelo contratado em relação a seus empregados”; “a vinculação do contratado à composição de custos acordada deve ser observada somente quanto aos aspectos sobre os quais o contratado tenha controle e, ao mesmo tempo, refiram-se a interesses diretos da administração contratante”; no caso em que os custos digam respeito ao relacionamento do contratado com terceiros, ou seja, não repercutem nos serviços prestados nem interessam à administração, não se revela cabível qualquer intervenção da administração, pois, além de não constituir finalidade pública, representaria colocar indevida e desnecessariamente o controle externo a serviço da tutela do relacionamento do contratado com terceiros”. Transcrevendo parte da manifestação do Ministério Público, o relator destacou que o crucial é a Administração se certificar “de que, na prestação dos serviços, os preços contratados e praticados sejam condizentes com o mercado, que o contratado observe as normas aplicáveis à atividade por ele exercida e que lhe entregue, tal como especificado, o objeto do contrato. Se, no caso presente, esses requisitos foram satisfeitos – e não há, nos autos, elementos que indiquem o contrário –, então a decisão de subcontratar uma cooperativa para a execução dos serviços previstos no Contrato DT-TUC 004/75 representou uma questão interna do consórcio contratado, alusiva à sua maneira particular de gerir o negócio e de compor e administrar seus custos”. Ademais, ressaltou questão essencial para o deslinde do caso concreto: “a inexistência de fundamento jurídico para reter a diferença apurada, diante da ausência de expressa previsão contratual. Em nome do princípio da segurança jurídica, ao particular é assegurado conhecer as ‘regras do jogo’, antes de seu início, para que, em um ambiente de estabilidade, possa estimar as consequências de seus atos; e daí firmar os termos de seus contratos, com exata ciência dos riscos associados à oferta do preço”. Os Embargos foram acolhidos, com efeito infringente sobre ao acórdão recorrido. Acórdão 2420/2013-Primeira Câmara, TC 008.748/2000-9, relator Ministro Valmir Campelo, 23.4.2013.


SEGUNDA CÂMARA

2. A aceitação excepcional de preços irrisórios ou nulos, prevista no § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993 (no caso de fornecimento de materiais e instalações de propriedade do próprio licitante), depende da apresentação por parte da licitante de justificativas que evidenciem, de forma contundente, a possibilidade de execução de sua oferta
Representação de empresa apontou possível irregularidade na Concorrência 40.163/2012, promovida pelo Arsenal da Marinha no Rio de Janeiro – AMRJ para contratação de serviços técnicos de engenharia em sistemas de submarinos e navios de superfície da Marinha do Brasil, com fornecimento de material. A representante contestou a desclassificação da sua proposta em razão do preço do material, considerado inexequível com base no art. 48, inciso II , da Lei 8.666/1993. Alegou que sua proposta deveria ter sido aceita em cumprimento à parte final do § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993, que permite a aceitação de preços nulos ou muito baixos quando o licitante é proprietário dos insumos a serem fornecidos. Acrescentou que a viabilidade da sua proposta poderia ser inferida também em razão dos seguintes fatores de redução de custo: a) estaria em fase final de execução de contrato que contempla objeto idêntico ao licitado no certame em tela, o que reduziria seus custos na implementação de nova avença; b) estaria em processo de negociação de compra de novos materiais e, com a inclusão no pedido dos materiais relativos ao certame, teria condições de negociar descontos significativos; c) a realização de serviços dentro do AMRJ, ainda que com baixa margem de lucro, seria estratégia comercial interessante para captação de outros clientes da iniciativa privada. A relatora destacou que a proposta da representante para fornecimento da tubulação de aço carbono representara tão somente 1,66% do valor orçado pelo AMRJ, o que seria "nítido exemplo de proposta irrisória, inadmissível, conforme disposto no § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993". Ressaltou que "a aceitação excepcional poderia ocorrer quando do fornecimento de 'materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração', mas o representante não logrou êxito em comprovar a mencionada singularidade." Acrescentou que "Não possuir os insumos em estoque ... importa em elevado risco para a Administração, que, ao contratá-la, poderia ficar sujeita ao sucesso do processo de compra dos materiais para viabilizar a execução do contrato". E mais: "A insegurança instaurada pela aceitação de proposta desse teor é justamente aquela repelida pelo § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993, que não admite propostas irrisórias/nulas dissociada de garantias fáticas que mitiguem o risco de inexecução do contrato". Em relação às demais razões apresentadas para o custo reduzido, considerou que "não tornam aceitável uma proposta desse patamar", uma vez que a Administração "não alcança os traços da estratégia comercial da empresa e não pode vislumbrar seus artifícios para alcance de metas e objetivos internos ...". Por fim, considerando que a licitante não evidenciou, de forma contundente, a possibilidade de execução de sua oferta, concluiu que a desclassificação da proposta não configurara ilegalidade. O Tribunal então, ao acolher a proposta da relatora, decidiu julgar a Representação improcedente. Acórdão 2186/2013-Segunda Câmara, TC 007.701/2013-6, relatora Ministra Ana Arraes, 23.4.2013.

PLENÁRIO

3. A participação de empresa cujo sócio tenha vínculo de parentesco com servidor da entidade licitante afronta, por interpretação analógica, o disposto no art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993. A alteração do contrato social no curso do certame não descaracteriza a irregularidade e constitui indício de simulação e fraude à licitação
Representação apontou possível irregularidade na Concorrência 001/2007, promovida pela Fundação Universidade Federal do Piauí - FUFPI/MEC, objetivando a contratação de empresa para a prestação de serviços de publicidade e propaganda. Segundo a representante, a participação no certame e posterior contratação de empresa cujo sócio – detentor de 30% do capital social – pertencia ao quadro de pessoal da promotora da licitação (FUFPI) configurou afronta ao disposto no artigo 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993, bem como ao item 5.1 do edital, que assim dispôs: “5.1. Não poderão participar da licitação as empresas que tenham entre seus dirigentes, gerentes, sócios detentores de mais de 5% (cinco por cento) do capital social, dirigentes, responsáveis e técnicos, servidor ou dirigentes de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação e empresas em consórcio.” A unidade técnica destacou que, no curso da licitação, o servidor da FUFPI retirou-se da sociedade, sendo substituído por sua filha. Destacou ainda que a referida empresa teria sido beneficiária de 21 processos de dispensa de licitação depois do ingresso do referido servidor no quadro societário. O relator, em consonância com a unidade técnica, rejeitou as justificativas apresentadas pela empresa e pelo servidor, ao concluir que a alteração efetivada no contrato social da empresa teve por objetivo afastar o impedimento tipificado no art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993. Apontou ainda a ocorrência de simulação com o intuito de fraudar o procedimento licitatório. Argumentou que "mesmo ao se considerar lícita a alteração do contrato social, não se afastou do impedimento constante do art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993". Isso porque, "consoante a jurisprudência desta Corte, as vedações explicitadas nesse dispositivo legal estão sujeitas a analogia e interpretação extensiva ..." . Ou seja, "qualquer situação que não esteja prevista na lei, mas que viole o dever de probidade imposto a todos os agentes públicos ou pessoa investida desta qualidade, deve ser proibida, por ser incompatível com os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade”. (Acórdão 1170/2010-Plenário). Especificamente em relação à participação de parentes em licitação, citou o Acórdão 607/2011-Plenário, no sentido de que “mesmo que a Lei nº 8.666, de 1993, não possua dispositivo vedando expressamente a participação de parentes em licitações ..., vê-se que foi essa a intenção axiológica do legislador ao estabelecer o art. 9º dessa Lei, em especial nos §§ 3º e 4º, vedando a prática de conflito de interesse nas licitações públicas ...". Ao se reportar ao caso concreto, destacou que a influência do servidor sobre os gestores da FUFPI foi determinante para a ocorrência das sucessivas contratações diretas da empresa. Ponderou, contudo, que a imposição de penalidades deveria ocorrer somente sobre a empresa, uma vez que não houve débito e que a conduta do servidor escapou à jurisdição do TCU por ter sido "praticada na condição de sócio da empresa e não como gestor de recursos públicos ... ". Em relação aos membros da comissão de licitação, ressaltou que "esses responsáveis tiveram conhecimento de que a empresa possuía, de forma relevante, em seu quadro societário parente de servidor da entidade". O Tribunal, ao acolher a proposta do relator, decidiu em relação a essa irregularidade: a) declarar, com fundamento no art. 46 da Lei 8.443/1992, a empresa inidônea para participar de licitações promovidas pela Administração Pública Federal pelo prazo de três anos; b) aplicar aos membros da comissão de licitação a multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992; c) encaminhar cópia da decisão à FUFPI para que averigue a pertinência de instauração de processo administrativo disciplinar para apurar eventuais desvios de conduta praticados pelo servidor. Precedentes mencionados: Acórdãos 1.170/2010 e 607/2011, todos do Plenário. Acórdão 1019/2013- Plenário, TC 018.621/2009-7, relator Ministro Benjamin Zymler, 24.4.2013.

4. A sanção prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993 (suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração) tem aplicação restrita ao órgão ou entidade que a cominou.
Agravo interposto pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) contra decisão cautelar que determinara a correção do edital do Pregão Eletrônico 122/ADCO/SRCO/2012 de modo a ajustá-lo ao disposto no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993, ou seja, para que a penalidade ali prevista alcance apenas as empresas suspensas por aquela estatal, consoante o entendimento do Acórdão 3.243/2012-Plenário. Argumentou a recorrente que: (i) a jurisprudência do TCU não estaria pacificada nos termos da citada decisão; (ii) diante da dúvida objetiva, seria tecnicamente impróprio falar-se em fummus boni iuris; (iii) a aplicação retroativa do novel entendimento atentaria contra o princípio da segurança jurídica consubstanciado no art. 2º, caput, da Lei 9.784/1999. O relator refutou todos os argumentos, esclarecendo que “o Tribunal pacificou a sua jurisprudência em considerar que a sanção prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993, que impõe a ‘suspensão temporária para participar em licitação e impedimento para contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos’, tem aplicação restrita ao órgão ou entidade que a aplicou” e restabeleceu “o entendimento já consolidado na sua jurisprudência, no sentido de fazer a distinção nítida entre as sanções previstas nos aludidos incisos III e IV do art. 87 da Lei 8.666/1993, conforme Acórdão 3.243/2012 – TCU – Plenário”. Quanto à suposta aplicação retroativa, o relator contra-argumentou que, além de o acórdão em questão não ter criado novo entendimento, mas restabelecido a jurisprudência antes consolidada, “a Infraero teve oportunidade de corrigir o instrumento convocatório logo após tomar conhecimento da edição da mencionada deliberação e, também, ao receber a impugnação apresentada ... , o que, entretanto, preferiu não fazer, mesmo após ter sido comunicada da Cautelar concedida no mesmo sentido pelo Tribunal”. “Em segundo lugar, as jurisprudências deste Tribunal e do Supremo Tribunal Federal são firmes no sentido de que o disposto na Lei 9.784/1999 não se aplica aos processos de controle externo apreciados por esta Corte de Contas.” O Plenário acompanhou o relator e negou provimento ao Agravo. Acórdão 1017/2013-Plenário, TC 046.782/2012-5, relator Ministro Aroldo Cedraz, 24.4.2013.


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