O governo já comunicou aos seus líderes no Congresso que deseja mudar
dois artigos da lei complementar 101, mais conhecida como Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF). A primeira alteração é do artigo 14 da
LRF e torna mais flexíveis as exigências para que o governo possa
conceder incentivo tributário, do qual decorra renúncia de receita. A
outra autoriza a mudança das condições financeiras dos contratos das
dívidas dos Estados renegociadas pela União com base na lei 9.496, de
1997.
O Valor teve acesso à minuta de projeto de lei complementar que
altera a LRF, entregue aos líderes do governo, durante reunião com a
ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, na semana passada.
Nesse encontro, Ideli formalizou a disposição do governo de negociar,
de forma conjunta, o fim da chamada 'guerra dos portos', com a redução
da alíquota interestadual do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) incidente sobre os importados; uma nova partilha do ICMS
nas compras pela internet, o chamado comércio eletrônico; e uma redução
do custo financeiro das dívidas estaduais renegociadas pela União.
A grande novidade é o interesse do governo em alterar o artigo 14
da LRF, pois ele não tem qualquer relação com os três temas que
estarão, daqui para frente, na mesa de negociação do governo com os
governadores e os parlamentares. Esse artigo estabelece que a concessão
ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária, da qual
decorra renúncia de receita, deverá atender uma de duas condições.
Mudanças já foram informadas aos líderes no Congresso
A primeira é a demonstração de que a renúncia foi considerada na
estimativa de receita da lei orçamentária e de que ela não afetará as
metas de resultados fiscais previstas na lei de diretrizes orçamentárias
(LDO). A segunda prevê que a renúncia deve estar acompanhada de medidas
de compensação, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação
de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de
tributo ou contribuição.
A minuta do anteprojeto de lei do governo inclui duas novas
condições alternativas, que, na prática, tornam menos rigorosas as
exigências para que o governo possa fazer concessão de incentivo
tributário. Se o projeto for aprovado, a renúncia de receita poderá
ocorrer desde que o governo comprove a "existência de excesso de
arrecadação tributária" naquele ano. Ou seja, não haveria mais
necessidade de compensar a perda de receita com majoração de outros
tributos e contribuições. Bastaria informar que houve excesso de
arrecadação naquele ano, suficiente para cobrir a perda.
Outra condição que seria incluída na LRF pelo projeto prevê que a
renúncia de receita poderá ser compensada pelo contingenciamento de
verbas orçamentárias. Neste caso, o benefício concedido só entraria em
vigor quando o governo implementasse o corte das verbas do Orçamento.
Não há ainda explicação oficial para a pretendida mudança do
artigo 14. Mas é provável que a alteração seja necessária para que o
governo continue com sua estratégia de desonerar a folha de salários do
setor industrial, medida que faz parte do programa Brasil Maior, lançado
em agosto do ano passado e renovado na semana passada.
O governo escolheu 15 setores da economia que receberão incentivo
tributário, pois as empresas desses setores pagarão apenas uma parte da
contribuição devida à Previdência Social, sendo o restante pago pelos
cofres públicos. Ou seja, haverá redução efetiva da carga tributária das
empresas escolhidas. Com isso, o governo espera tornar os produtos
desses setores mais competitivos frente aos estrangeiros.
Por conta da medida, a renúncia de receita da Previdência foi
estimada, pelo Ministério da Fazenda, em R$ 7,2 bilhões por ano. Na
exposição de motivos que acompanhou a medida provisória 563, o governo
não explicou como essa perda será compensada. Diz apenas que a renúncia
fiscal líquida (ou seja, já considerando as receitas do Tesouro com
novas medidas tributárias) será de R$ 1,79 bilhão este ano, R$ 5,2
bilhões em 2013 e R$ 5,5 bilhões em 2014.
O anteprojeto de lei complementar prevê também mudança no artigo
35 da LRF. Esse artigo proíbe a realização de operação de crédito entre
os entes da Federação, ainda que sob a forma de novação, refinanciamento
ou postergação de dívida contraída anteriormente. Para mudar as
condições financeiras dos atuais contratos de dívidas estaduais
renegociadas pela União, como desejam os governadores, esse artigo terá
que ser alterado.
O governo concorda e sugere, no anteprojeto, que uma nova
renegociação das condições dos contratos seja excluída da vedação do
artigo 35, desde que "os juros e a atualização monetária das operações
não ultrapassem, cumulativamente, a variação da taxa média ajustada nos
financiamentos diários apurados no Sistema Especial de Liquidação e de
Custódia (Selic), divulgada pelo Banco Central".
Ao contrário do noticiado até agora, o governo não propõe que o
atual indexador das dívidas, o IGP-DI, seja substituído pela Selic. O
anteprojeto diz apenas que a Selic será o teto para o novo custo
financeiro. Há um detalhe interessante. O anteprojeto não prevê uma
renegociação das dívidas dos municípios, como quer o prefeito de São
Paulo, Gilberto Kassab.
Fonte: Valor Econômico
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